A Verdade Compensa
Cristina Robalo Cordeiro, Vice-Reitora da Universidade de Coimbra
As universidades vêem hoje os seus estudantes como clientes. Assim o quer a nossa sociedade e a sua economia dita (e é um eufemismo) neoliberal.A questão é saber se melhor os atraem pela facilidade ou pela dificuldade dos estudos que oferecem. Algumas faculdades (como a Medicina) podem dar-se ao luxo, graças ao seu alto grau de atractividade, de nem sequer se interrogarem acerca do método a utilizar para captar o seu público. Outras (como as Letras) debatem-se com a impotência de conquistar, se não as multidões de outrora, pelo menos o pequeno contingente que lhes assegurará a sobrevivência. Ao fim de anos de deixar andar e de deixar passar, parece hoje que a “via estreita” tem maiores hipóteses de garantir o longo termo. E esta conclusão vem dos próprios estudantes que começam a queixar-se da má qualidade – isto é, da fraca cotação no mercado – dos seus diplomas.
A crise pedagógica que vivemos, se é menos quantificável do que a crise financeira, releva no entanto de causas similares: sucesso fraudulento, produtos tóxicos, títulos e valores fictícios, mentiras. O raciocínio (explícito ou não) das escolas é o seguinte: quanto mais complacente for o nosso ensino mais persuasivos seremos. Aliás, que alternativa temos à indulgência quando, depois do desaparecimento do grego e do latim (tidos como disciplinas ao mesmo tempo exigentes e inúteis), a linguística, a física ou as matemáticas conhecem a desertificação, seguidas, dentro em pouco, pela história, a filosofia e a química?
A pedagogia, ainda menos do que a economia, não pode permitir-se enfraquecer os seus laços com a ética. Se o capitalismo, pelo menos o dos seus fundadores (muitas vezes austeros luteranos), assentava no trabalho e na virtude, a pedagogia é em si mesmo o trabalho e a virtude. Uma pedagogia universitária – pois que a educação das crianças é outra coisa – não pode, sem se contradizer, cair no laxismo: só no rigor disciplinar as letras como as ciências encontram a sua dignidade e a sua credibilidade.
Se o comerciante tem interesse em praticar a honestidade, um professor deve professar a probidade intelectual antes mesmo de ensinar a sua matéria própria.As universidades vencedoras serão aquelas que souberem permanecer fiéis à lei – moral – do mercado. A boa moeda acaba sempre por valer mais do que a má. O que significa, em termos epistemológicos, que a verdade compensa!
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Jornal Página 1, 22 de Abril de 2009
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