"No meu livro, escrevemos nós"
A Psicologia co-construída
Aos homens que pensam
deter as ciências, queiram permitir que elas voem pelo Mundo: a primeira
aprendizagem acontece na partilha da observação e demora muitas pessoas.
É para todos, a Psicologia.
Para os que a estudam, para os que a aplicam, para os que a lêem; para os que a
esperam, para os que a descobrem, para os que a defendem. Sem a barreira da
pontuação, a Psicologia é para todos. Apontemos as luzes para os que a pensam.
A primeira decepção:
não há um mecanismo cognitivo e comportamental que a permita eficiente; não há
um paradigma infalível; não há uma lista de regras semânticas. A Psicologia
desilude: não é uma, não é sozinha, não é logo. É recriada, em todas as
sessões. Neste pulsar, com o cliente, o processo nunca se replica: a
Psicologia, quando é Psicologia, é uma orientação co-construída, de vida
efémera. De sessão para sessão, a ingenuidade migra, por se descobrir um
processo também escolhido, mais escolhido, pelo cliente; um ramo, que rega
outro, até a árvore querer crescer. Uma palavra de apreço a todos os manuais
galácticos que idolatramos, aos anos de anfiteatro. Afinal, são eles a nossa
licença para aprender.
Numa prevaricação da
escrita objectiva, falo de mim. Leio Rogers: fascínio pelos olhos que vêem a
Pessoa. Antes-Depois, cachos de técnicas que nos tornam poderosos Profissionais
do Humanismo. Para quem lê apenas: o rigor ainda sem teor. Uma vez (talvez ficasse lírico dizer que
foi há muitas experiências, mas foi na imaturidade de dois anos) planeei uma
sessão orientada para a história de vida de um cliente. Começou a linha. A
caneta pousou. Percebi que não era preciso a linha, naquele dia. Não era esse o
pedido. A linha ser-me-ia dada pelos segmentos e a cronologia não pedia
urgência. Fui espaço, templo de validações, folha partilhada. Neste dia aceitei, finalmente, o
movimento simples de saber que a Psicologia é uma relação e que nesta, há uma
receita de palavras desordenadas: o cliente escolhe a primeira e nós orientamos
a procura do sentido das seguintes.
Depois, nova ideia
interrogativa, que tocou no ombro da anterior: que método tinha, que linha de
pensamento seguia, o que me orientava. Sem perder o locus em mim, não
temi aceitar que a resposta é também detida por cada Pessoa na qual me centro.
A que conheço e a que virei a conhecer, em páginas terapêuticas co-construídas,
histórias de tricot que sem começo, sem fim, param temporariamente onde
conseguem aquecer.
E a Psicologia - passo
a cédula -, ainda é o espaço de relação onde um Homem consegue orientar Outro
para o poder que tem no livro que escrevemos.
Ana Rita Caldeira
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