segunda-feira, 24 de junho de 2013

[Mudança]: "No meu livro, escrevemos nós"

"No meu livro, escrevemos nós"
A Psicologia co-construída

Aos homens que pensam deter as ciências, queiram permitir que elas voem pelo Mundo: a primeira aprendizagem acontece na partilha da observação e demora muitas pessoas.
É para todos, a Psicologia. Para os que a estudam, para os que a aplicam, para os que a lêem; para os que a esperam, para os que a descobrem, para os que a defendem. Sem a barreira da pontuação, a Psicologia é para todos. Apontemos as luzes para os que a pensam.
A primeira decepção: não há um mecanismo cognitivo e comportamental que a permita eficiente; não há um paradigma infalível; não há uma lista de regras semânticas. A Psicologia desilude: não é uma, não é sozinha, não é logo. É recriada, em todas as sessões. Neste pulsar, com o cliente, o processo nunca se replica: a Psicologia, quando é Psicologia, é uma orientação co-construída, de vida efémera. De sessão para sessão, a ingenuidade migra, por se descobrir um processo também escolhido, mais escolhido, pelo cliente; um ramo, que rega outro, até a árvore querer crescer. Uma palavra de apreço a todos os manuais galácticos que idolatramos, aos anos de anfiteatro. Afinal, são eles a nossa licença para aprender.
Numa prevaricação da escrita objectiva, falo de mim. Leio Rogers: fascínio pelos olhos que vêem a Pessoa. Antes-Depois, cachos de técnicas que nos tornam poderosos Profissionais do Humanismo. Para quem lê apenas: o rigor ainda sem teor. Uma vez (talvez ficasse lírico dizer que foi há muitas experiências, mas foi na imaturidade de dois anos) planeei uma sessão orientada para a história de vida de um cliente. Começou a linha. A caneta pousou. Percebi que não era preciso a linha, naquele dia. Não era esse o pedido. A linha ser-me-ia dada pelos segmentos e a cronologia não pedia urgência. Fui espaço, templo de validações, folha partilhada. Neste dia aceitei, finalmente, o movimento simples de saber que a Psicologia é uma relação e que nesta, há uma receita de palavras desordenadas: o cliente escolhe a primeira e nós orientamos a procura do sentido das seguintes.
Depois, nova ideia interrogativa, que tocou no ombro da anterior: que método tinha, que linha de pensamento seguia, o que me orientava. Sem perder o locus em mim, não temi aceitar que a resposta é também detida por cada Pessoa na qual me centro. A que conheço e a que virei a conhecer, em páginas terapêuticas co-construídas, histórias de tricot que sem começo, sem fim, param temporariamente onde conseguem aquecer. 
E a Psicologia - passo a cédula -, ainda é o espaço de relação onde um Homem consegue orientar Outro para o poder que tem no livro que escrevemos.

Ana Rita Caldeira

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