Esta arte - a que vemos, - não é a mesma. Não é a que eu vejo e você, aqui perto, consegue ver. Mas é a mesma estrutura, o mesmo espaço e o mesmo tempo. Então porque é que esta arte não é também una na forma como a integramos?
Lembra-se quando Magritte afirmou,
perante a imagem convencional de um cachimbo, "ceci n´est pas une
pipe" (1928-29)? Pode ter sido um pedido ao Homem-Artista para parar
de ambicionar representar a vida tal como ela é e as coisas tal como são, num
realismo absurdo e inatingível.
Foi um pedido ao Homem-Artista para admitir que é um Zé-Ninguém quando fala, quando se move, quando executa; que só em conjunto com a obra terá algum significado, significado esse que nunca será o mesmo aqui, ali ou além; nunca será exactamente o mesmo para mim, para si e para o Homem-Artista. É disso que vive a magnitude do significado de arte: tê-lo de todas as formas, quantas aquelas em que existimos.
Isto levanta uma celeuma assustadora, bem sei. Então não é possível perceber a arte da mesma forma? Ficaremos destinados ao sulco inevitável, ainda que por vezes ténue, que existe entre a minha interpretação e a sua interpretação? Sim. Lamento. Mas não é isto que buscamos? Diga-me uma peça de arte que tenha esgotado os seus significados e que tenha, num momento impávido, tido o mesmo para Fulano e Beltrano? Nenhuma, pelo menos a intemporal. Porque essa, vive preparada para rearranjos e ajustamentos ao contexto e aos novos olhos; os que nascem. Tal como nós - pensamentos e movimentos em sociedade.
Porque "Guernica" (Picasso, 1937) do séc. XX não é a mesma do séc. XXI e é precisamente isso que a torna sempre nova e emocionante. Porque nós, as nossas emoções e as nossas narrativas não são as mesmas hoje, amanhã e depois; a interacção é sempre diferente, entre obra-pessoa e pessoa-obra. Restamos assim, subjugados a este jogo de interacções que permite, aos mais audazes, tentar perceber o que o outro vê e acomodar-se à aventura de nunca o perceber.
Parece confuso, obtuso, cruelmente epistemológico. Não creio. É tão simples como pintar uma rua e percebê-la como rua. É tão simples como ler a palavra cachimbo e daí, imageticamente, termos um. Dentro dessa simplicidade -mágica- deve ser percebido que o significado que uma rua tem para mim, não terá para si, nem para os nossos filhos, daqui a quantos anos forem vida. Se percebermos isto, podemos perceber tudo sem limites e sem barreiras interpretativas. E mais então, teremos paladar para construir, com os outros, que também somos nós.
Falo agora na obra "A Culpa não é Minha" (João Pedro Vale, 2003). Também irónica, retrata a forma como podemos ficar encalhados, amarrados, petrificados, se atracarmos a criação e o "mais-além" que é Nosso, de Todos e de Ninguém. Não vou explicar a minha confusão, deixo-a assim, para a sua interpretação cuidada e objectiva. Se a arte for para o autor, não haverá arte. Se a arte for para o público, não haverá arte. Se a arte for um momento, não haverá arte. Se a arte for intocável, não haverá arte. Se a arte tiver uma data, não haverá arte. A arte não quer ser um Eu. Não quer ser um Ninguém, um Alguém; não quer ser Dela própria.
Só assim haverá arte.
Se personificarmos a arte vemo-la como uma túlipa leve, crua, devastadora. Vemo-la como Pipilotti Rist a quis, em Ever is All Over (1997), cheia de liberdade e impacto, livre de tudo e de ela própria.
Deixo-nos um conselho: não queiramos perceber nada do que digo. É apenas a minha forma de ver arte, muito diferente da sua, certamente. Deixemo-nos ver; assim. Deixemo-nos ser olhos de Pessoas, tacto que quer perceber, areia que se move unida, livro que se reescreve em todas as horas. Se for assim, será não só arte para nós, como de ninguém.
Foi um pedido ao Homem-Artista para admitir que é um Zé-Ninguém quando fala, quando se move, quando executa; que só em conjunto com a obra terá algum significado, significado esse que nunca será o mesmo aqui, ali ou além; nunca será exactamente o mesmo para mim, para si e para o Homem-Artista. É disso que vive a magnitude do significado de arte: tê-lo de todas as formas, quantas aquelas em que existimos.
Isto levanta uma celeuma assustadora, bem sei. Então não é possível perceber a arte da mesma forma? Ficaremos destinados ao sulco inevitável, ainda que por vezes ténue, que existe entre a minha interpretação e a sua interpretação? Sim. Lamento. Mas não é isto que buscamos? Diga-me uma peça de arte que tenha esgotado os seus significados e que tenha, num momento impávido, tido o mesmo para Fulano e Beltrano? Nenhuma, pelo menos a intemporal. Porque essa, vive preparada para rearranjos e ajustamentos ao contexto e aos novos olhos; os que nascem. Tal como nós - pensamentos e movimentos em sociedade.
Porque "Guernica" (Picasso, 1937) do séc. XX não é a mesma do séc. XXI e é precisamente isso que a torna sempre nova e emocionante. Porque nós, as nossas emoções e as nossas narrativas não são as mesmas hoje, amanhã e depois; a interacção é sempre diferente, entre obra-pessoa e pessoa-obra. Restamos assim, subjugados a este jogo de interacções que permite, aos mais audazes, tentar perceber o que o outro vê e acomodar-se à aventura de nunca o perceber.
Parece confuso, obtuso, cruelmente epistemológico. Não creio. É tão simples como pintar uma rua e percebê-la como rua. É tão simples como ler a palavra cachimbo e daí, imageticamente, termos um. Dentro dessa simplicidade -mágica- deve ser percebido que o significado que uma rua tem para mim, não terá para si, nem para os nossos filhos, daqui a quantos anos forem vida. Se percebermos isto, podemos perceber tudo sem limites e sem barreiras interpretativas. E mais então, teremos paladar para construir, com os outros, que também somos nós.
Falo agora na obra "A Culpa não é Minha" (João Pedro Vale, 2003). Também irónica, retrata a forma como podemos ficar encalhados, amarrados, petrificados, se atracarmos a criação e o "mais-além" que é Nosso, de Todos e de Ninguém. Não vou explicar a minha confusão, deixo-a assim, para a sua interpretação cuidada e objectiva. Se a arte for para o autor, não haverá arte. Se a arte for para o público, não haverá arte. Se a arte for um momento, não haverá arte. Se a arte for intocável, não haverá arte. Se a arte tiver uma data, não haverá arte. A arte não quer ser um Eu. Não quer ser um Ninguém, um Alguém; não quer ser Dela própria.
Só assim haverá arte.
Se personificarmos a arte vemo-la como uma túlipa leve, crua, devastadora. Vemo-la como Pipilotti Rist a quis, em Ever is All Over (1997), cheia de liberdade e impacto, livre de tudo e de ela própria.
Deixo-nos um conselho: não queiramos perceber nada do que digo. É apenas a minha forma de ver arte, muito diferente da sua, certamente. Deixemo-nos ver; assim. Deixemo-nos ser olhos de Pessoas, tacto que quer perceber, areia que se move unida, livro que se reescreve em todas as horas. Se for assim, será não só arte para nós, como de ninguém.
Ana Rita Caldeira da Silva
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(Imagens retiradas do google)
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