Já
vos falei, em identidade (quem sou), do corpo, de como abrigo nele diferentes
partes de mim e do espaço que ocupo, com quem o troco e o que o torna o meu
espaço. Hoje vou falar-vos de comunicação. Estar com alguém, comunicar, é um
factor protector essencial na prevenção. Como percebemos o que o outro nos diz?
Encontramos algum significado no seu dizer? E esse significado encontra alguma
ressonância nas nossas vivências do passado que nos permite seleccionar uma
resposta? Tenho eu vontade de responder? E tenho eu as palavras para responder?
E se o fizer consigo eu perceber como é que o outro está a reagir à minha
comunicação? Este é o ciclo comunicacional onde pode surgir o bloqueio. A
própria atitude, postura corporal, o tom de voz, poderão ser entraves quando
entram em dissonância com a mensagem. Finalmente a própria motivação ou
disponibilidade emocional introduzem ruídos na comunicação que estão
frequentemente na origem de mal entendidos e da construção de distâncias entre as
pessoas.
O
dizer algo a alguém é pôr fora de nós o que está unicamente na nossa cabeça,
dando-lhe deste modo existência partilhada. Dizer é manter a ponte entre duas
pessoas, protege-la da erosão do ritmo e do tempo.
Há
inúmeras dinâmicas que se debruçam sobre este tema. Pedir a cada elemento do
grupo que transmita uma emoção específica (apenas do seu conhecimento) ao dizer
uma frase específica, permite aos jogadores consciencializar quais os elementos
que permitem identificar a emoção transmitida. Frequentemente os jogadores
recorrem à linguagem corporal para melhor exprimir a emoção mas o dinamizador
poderá dificultar-lhes a tarefa pedindo que a mensagem seja transmitida sem a
possibilidade dos receptores visualizarem o emissor. Conseguirá o jogador colocar
na entoação, no ritmo dos discurso ou na dicção os sinais que permitam
identificar uma emoção? Esse é sem dúvida o desafio.
Noutra
perspectiva pode-se pedir para que alguém comunique uma ideia sem poder
utilizar a palavra que diretamente a identifica. Pode-se pedir a diferentes
jogadores que adoptem ao longo de uma conversa normal, um conjunto de posturas
(estar de costas para o grupo, abanar repetidamente a perna, posicionar o corpo
orientado para que comunica, bocejar constantemente, …) e pedir no final que as
pessoas transmitam o que sentiram ao longo da conversa em termos de atitude ou
receptividade por parte dos colegas. Pode-se pedir que uma mensagem seja
transmitida à distância no meio de o maior dos ruídos, ou contar-se
sucessivamente uma história passada de participante para participante e
analisar-se a perda progressiva de conteúdos e quais os que conseguem ser
mantidos inalterados até ao final da sequência.
São
muitas as dinâmicas que podem ser usadas para trabalhar a comunicação. Mas mais
do que as dinâmicas em si, é na reflexão que melhor se trabalha a comunicação.
Contem-me o que se passou no jogo? Cada participante narrará uma perspectiva
pessoal de uma vivência comum, Não há leituras certas e erradas, apenas
leituras pessoais, feitas a partir da sensibilidade de cada um e dos filtros
que a experiência impõe. O que é que sentiram no jogo? À acção alia-se a emoção
em todos os seus gradientes. Haverá convergência ou divergência mas é na
diferença que mais se aprende e no respeito pelo sentir dos outros. Como se
organizaram para ultrapassar a tarefa? O emergir da estratégia, pessoal ou
colectiva, partilhada ou imposta, passiva ou ativa, confere à acção um novo
significado dentro do qual se pode avaliar a eficácia e a capacidade de
adaptação. Qual era a metáfora deste jogo? A análise volta-se agora para os
conteúdos, a mensagem subjacente à acção. Tem a ver com a cooperação, tem a ver
com gestão de emoções, tem a ver com… E assim se estabelece uma ponte entre o
lúdico e o quotidiano a meio caminho entre o agir e o pensar. E finalmente… O
que aprenderam? O que fariam diferente se voltassem a jogar?
Nesta
partilha todos são actores, uns porque se expressam, outros porque ouvem,
outros ainda porque são a plateia do drama posto em cena. Até vocês, leitores,
têm um papel nesta dinâmica. São validadores da vivência de alguém. E se alguma
destas ideias dispersas der origem a uma nova acção, são perpetuadores…
depositários… herdeiros...
Façam
disso um bom proveito.
Raúl
Melo
Sem comentários:
Enviar um comentário