Estaremos a oferecer o que os idosos
desejam/precisam?
Neste primeiro apontamento de 2014
acerca do envelhecimento, pretendo contemplar a adequação das ofertas de
entretenimento/lazer/actividades direccionadas aos idosos.
Como é comummente aceite a ideia (e
é patente no documento da UNESCO de 1985, p. 51 referido em *1) de que um
envelhecimento activo e bem sucedido está ligado a uma participação e
envolvimento em actividades, lúdicas, de cariz social como voluntariado e actividades
para prevenir o sedentarismo e o isolamento. É referido também nesse artigo que
a participação dos idosos nas variadas ofertas de educação continua a ser
insatisfatória. Reflecte-se portanto na dinâmica recursos disponíveis vs
aproveitamento dos mesmos.
Mas se os idosos decidem não aderir
a tais ofertas, no mínimo serão ingratos? Ou as ofertas não lhes interessam? O
que será que lhes interessa?
Parece-me que ao abrigo de
estereótipos de invalidez e de regresso à infância os idosos são forçados,
talvez pela ausência de alternativa, a aderir a actividades que pouco os
estimulam, tanto cognitivamente como animicamente, pois como é referido no
artigo*2, "...não é o simples facto de participar em actividades de lazer
que garante a promoção do bem-estar dos idosos: é ainda necessário considerar a
qualidade e o significado que tais actividades têm para os mesmos."
Supondo que os idosos, ou
genericamente todos os que se reformaram da vinculação a um emprego,
continuassem a ter um papel activo socialmente, longe
do estereótipo de inutilidade social e humana a que são vetados. E se
fosse possível continuar a encará-los como adultos responsáveis e capazes
de tomar decisões sobre o que lhes interessa fazer e o que os motiva, nessa
fase privilegiada de disponibilidade para perseguir interesses e
gostos que foram adiados ao longo da vida, a sua participação em actividades
que lhes aumentasse a qualidade de vida, em vez de actividades infantilisantes
e com pouco contributo para a sua autonomia e dignidade, aumentaria?
Não sei se será assim tão simples.
Outros autores (van der Kamp & Scheeren, 1997, p.151 referidos em *1)
sugerem que o envolvimento, por exemplo nas actividades de educação formal para
adultos entre as classes etárias mais avançadas está ligado ao nível de
escolaridade anterior e à situação laboral. Ou seja se estes idosos a que me
refiro foram uma das gerações que teve menos acesso a níveis de escolaridade
elevados e se já se encontram reformados a sua participação em iniciativas de
educação formal para adultos será eventualmente muito baixa.
Há ainda a colaborar com esta
abstinência a suposta e popular ideia de que “burro velho não aprende línguas”,
e a vergonha de “não saber”, que poderá estar a inibir muitos de participar.
A cultura da vergonha e do medo do
erro é difícil de combater especialmente quando está aliada
ao estereótipo “reforma=inutilidade” que ajuda a nem contemplar a
ideia de continuar a crescer por dentro e a aprender.
O autor *1 deixa sugestões a quem
trabalha com esta população: “ a qualidade do ambiente é determinante para o
desenvolvimento intelectual dos idosos [como acontece nas restantes faixas
etárias] – há necessidade que se mantenham cognitivamente activos, que sejam
responsabilizados por tarefas, que constituam desafios às suas capacidades
intelectuais, que se lhes deixe oportunidade de resolver os próprios problemas
sem a eles se substituir, desnecessariamente.”. Moody (1990) (cit in *1),
refere ainda que “não devemos preocupar-nos tanto em transmitir novos
conhecimentos ou informações, mas sobretudo, com desencadear uma nova
compreensão do que já está presente nos educandos”.
Ora a mim estas ideias sugerem-me
que a maior dificuldade em conseguir a adesão dos idosos às actividades e
programas (e à psicoterapia?) para eles criados é criada por quem os planeia,
supondo que são essencialmente diferentes, dos que seriam propostos aos
restantes adultos. Um processamento aprofundado das “lições” (de vida) já
aprendidas, e não apenas num regresso às colagens com massas poderia ser um
caminho para “…que assumam melhor o próprio envelhecimento…” (UNESCO, 1985
referida em *1).
Não será isso que
precisamos/desejamos todos?
Ana
Carla Nunes
Referências:
*1 - Simões, A. (1999). A Educação
dos Idosos: uma Tarefa Prioritária, Revista Portuguesa de Educação, 12
(2), pp.07-27.
*2- Simões, A., Lima,M., Vieira, C.,
Ferreira, J. Oliveira, a., Alcoforado, L., Neto, F. , Ruiz, F., Cardoso, A.,
Felizardo, S. & Sousa, L. (2006). Promover o bem estar dos idosos: um
estudo experimental, Psychologica, 42, 115-131.
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